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quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Libertárias / Libertarias

O filme abre com legendas que informam sobre o início da Guerra Civil, em julho de 1936: o Exército se rebela contra o governo republicano. “As massas pedem um estado revolucionário. O governo legal é incapaz de controlar a situação. Começa a Guerra Civil Espanhola, a última guerra idealista, o último sonho de um povo voltado para o impossível, a utopia”.

O catalão Vicente Aranda, um dos mais respeitados do cinema espanhol das últimas décadas, conhecido por dramas de forte erotismo (Amantes, Juana la Loca), vai discutir sobre as dissensões existentes entre os republicanos, os antifascistas – o mesmo tema também do eterno socialista Ken Loach em seu Terra e Liberdade/Land and Freedom, feito exatamente um ano antes, 1995. Eram vários grupos, de diversos matizes ideológicos, que uniram forças para enfrentar o Exército – anarquistas, comunistas, socialistas, idealistas das mais diversas nacionalidades.

O filme começa num momento em que esses grupos acabam de tomar uma cidade – não se diz qual é. Na sua fúria revolucionária, as massas estão atacando igrejas e conventos, pondo abaixo as cruzes, queimando os símbolos religiosos; era o momento da crença em que só haveria autêntica liberdade “quando o último padre fosse enforcado nas tripas do último capitalista”.

Então somos apresentados a Maria (Ariadna Gil), uma jovem freira de um convento cuja madre superiora está distribuindo dinheiro para que suas religiosas pudessem fugir e escapar dos revolucionários. Ao longo das duas horas seguintes, seguiremos a via sacra de Maria em meio ao conflito sangrento.

Ela foge do convento e procura abrigo em uma casa em cuja porta está pregado um panfleto católico. Ledo engano: ali é um bordel. Que, logo em seguida, recebe a visita de Pilar (Ana Belén) e duas companheiras anarquistas do movimento Mulheres Livres. As revolucionárias fazem um longo discurso sobre a liberdade, o fim da religião, da putaria, da opressão capitalista e machista. Maria e várias das putas irão juntar-se à luta de Pilar e de sua amiga Floren (Victoria Abril), que se define como “anarquista, espiritista e coxa”, e acredita que Jesus é mulher e Deus é fascista.

Assim como sabia a Bíblia de cor e salteado, a ex-freira Maria vai aprender a citar longos trechos dos manuais revolucionários de Bakunin.

Na sua fase revolucionária, John Lennon sintetizou que a mulher é o negro do mundo; Vicente Aranda mostrará que Pilar, Floren e suas companheiras anarquistas serão derrotadas duas vezes – primeiro pela decisão dos líderes republicanos de profissionalizar a luta contra os fascistas, o que não incluía mulheres no front de batalha; e, depois (o filme não mostra isso, mas sabemos o que aconteceria), a derrota geral, de todas aquelas facções, diante do fascismo.

É interessante como, bem espanholamente, Aranda não dispensa o humor, mesmo em meio a um épico sério, duro, pesado, violento, sobre a última guerra idealista, a última guerra romântica. Lá pelas tantas, nas trincheiras, no front, Floren diz: “Somos representantes de toda a sociedade: uma freira, putas, anarquistas, ladrões.” Depois de fazer um longo discurso num megafone, tentando convencer os inimigos além trincheira de que soldado também é povo, venha para o nosso lado, um revolucionário desabafa: “Em vez de lutar, fazemos discursos”.

“É ruim esquecer”

Vejo um bom texto do El País, assinado por Diego Galán, sobre o filme. O texto é deste ano de 2009, 13 anos depois do lançamento do filme; pelo que entendi, foi escrito pela ocasião do lançamento do DVD do filme como brinde do jornal madrilenho. É repleto de informações, e por isso vou transcrevê-lo:

“Hacía 20 años que Vicente Aranda tenía el proyecto de realizar una película ambientada en la Guerra Civil cuyas protagonistas fueran mujeres en el frente. Había escrito un proyecto de guión (guión é roteiro) con el crítico de cine José Luis Guarner y el novelista Antonio Rabinad, pero la plasmación cinematográfica de Libertarias no ocurrió hasta 1996. “Es malo olvidar”, explicó en Fotogramas antes de rodar la película. “Somos hijos, hermanos y nietos de la gente que vivió aquello, y yo no estoy dispuesto a ser colaborador de la amnesia del país. La utopía sólo será algo absolutamente irrealizable si dejamos de pensar en ella”.

Según Aranda, Libertarias quiso precisar “que si los hombres lucharon en la guerra por la instauración de la justicia en el mundo, las mujeres quisieron que esa justicia alcanzase al reconocimiento de sus reivindicaciones”, y para ello se propuso contar la historia de “unas mujeres que prefirieron morir de pie, como los hombres, a vivir de rodillas como criadas”.

En el extenso estudio dedicado a esta película en La guerra civil española: cine y propaganda, Magí Crusells subrayó como significativo el discurso del personaje Pilar (Ana Belén), integrante de Mujeres Libres, cuando dice: “Somos anarquistas, somos libertarias, pero también somos mujeres y queremos hacer nuestra revolución. Queremos pegar tiros para poder exigir nuestra parte a la hora del reparto”. En este sentido, según Aranda, “el fusil representaba el poder para las mujeres porque significaba poder implantar sus ideas; por eso lucharon contra los nacionales y los republicanos, perdiendo contra ambos por defender los ideales anarquistas y los de las mujeres. El líder anarcosindicalista Buenaventura Durruti aparece en el filme ordenando la retirada de las mujeres de los frentes; en ese momento surgió la contradicción del movimiento anarquista, que quería la libertad absoluta del individuo. Esta película es una crónica de cómo toda revolución acaba devorando a sus hijos; en el caso de Libertarias, a sus hijas”.

De ahí que Javier Rioyo comentara en Cinemanía que “Libertarias no es una película imparcial; es a favor de los que creyeron en la libertad, de los que pensaron que la utopía y la revolución eran posibles, una película a favor de los perdedores”, lo que Rosa Regàs matizó en este periódico haciendo un elogio de las “mujeres libertarias que tuvieron por unos meses conciencia de ese mundo. Mujeres libertarias condenadas a la incomprensión y a luchar en dos frentes a la vez. Mujeres libertarias que accedieron con su coraje a la dignidad y la complicidad, denigradas y engañadas por los suyos, ultrajadas, violadas, degolladas por los otros. Y es que la guerra, ni por las grandes causas, es cosa de mujeres, dicen los hombres”.

Fue polémica esta obra de Aranda, especialmente comparada con Tierra y libertad, de Ken Loach, estrenada en las mismas fechas, “en la que sí se representa con concisión y nitidez la dinámica revolucionaria bolchevique; por ejemplo, en la escena de la asamblea de campesinos”, según el crítico de El País, frente a la opinión de Molina Foix en Fotogramas, a quien la película de Loach le pareció “sobrevalorada”: “Libertarias, al contrario que Tierra y libertad, evita la santificación melosa de sus protagonistas y la caricatura de los antagonistas. Otra de las virtudes de la película es la sabia alternancia entre lo épico y lo privado; las escenas de combate resultan muy convincentes, pero los contrapuntos amorosos y patéticos tienen el sonido de la verdad”.



Libertárias / Libertarias

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