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sábado, 28 de janeiro de 2012

Venezuela saiu do CIADI

Por: Modesto Emilio Guerrero

A correta decisão governamental de Miraflores, de se retirar do Centro Internacional de Ajuste de Diferenças Relativas a Investimentos, conhecido por sua sigla em inglês CIADI, tem dois valores, um concreto e outro simbólico, ambos de grande significado hoje em dia.

Quanto à primeira conjuntura, o Estado bolivariano deixa de estar subordinado a um organismo do sistema mundial de Estados dominantes, mediante um dos seus instrumentos, o Banco Mundial, sempre dirigido por alguns dos seus gestores e estruturado com um único objetivo: proteger o regime de investimentos das empresas transnacionais no mundo. Não foi por acaso sua data de nascimento, 1965, ano chave de uma etapa mundial de questionamentos e desafios políticos e estatais (rebeliões, revoluções anticoloniais e transformações nacionalistas) ao regime de investimentos imperiais, suas empresas e Estados sede, na África, na América Latina e na Ásia.

Com esta decisão, a Venezuela é mais independente como Estado, como sociedade, regime e governo, ou, para ser dialético, menos dependente. A independência total ou integral só será possível quando uma estrutura econômica e estatal não capitalista sustitua o que hoje impera no nosso país. Se desvincular do CIADI reforça a independência, mas sempre em termos relativos, subordinados a uma força estrutural superior, o domínio capitalista mundial e sua expressão atual no Estado e na economia venezuelana, mais conhecida como "Burocracia". O mecanismo mundial é simples: o que economizamos ao rejeitar cobranças do CIADI, eles vão obter por outro mecanismos da estrutura mundial de poder do sistema capitalista. Não podemos escapar disso com ações isoladas, mesmo que sejam ações valentes como a de se retirar do CIADI. É similar à luta contra a dívida externa.

O valor simbólico tem um valor parecido no atual contexto geopolítico. Serve para mostrar ao mundo e, sobretudo, aos povos latino-americanos, que é possível viver sem o CIADI. A ideia colonizante instalada nos governos do continente, com a exceção do Equador, da Bolívia, de Cuba e algum outro Estado de menor força, é que devem conviver, compartilhar e se subordinar a esses organismos. Inclusive quando os discursos oficiais proclamam o contrário, como nos casos da Argentina, do Brasil, do México ou do Uruguai. Esse mesmo valor simbólico é solidário, correspondente à resistência da Bolívia e do Equador às pressões do CIADI desde 2007. Serve moral e politicamente a esses Estados e aos povos. E em terceiro lugar, afirma que o caráter altamente contraditório da política exterior venezuelana durante os últimos dois ou três anos, sobretudo desde o final de 2010, tem limites. A inevitável pressão imperialista, a debilidade estrutural do país no contexto da economia mundial, a relação de forças políticas na sociedade, o caráter altamente revolucionário de sua ampla e complexa vanguarda bolivariana, condicionam o curso de qualquer retrocesso. Torna-o ainda mais contraditório e o limita.

A que a Venezuela renuncia

Da mesma forma que uma conspiração financeira internacional ou uma nova "crise" da dívida externa, vários países latino-americanos vivem apreensivos pelas sentenças do tribunal internacional do CIADI. Chama a atenção que os mais agredidos por este organismo judicial do Banco Mundial são os regimes sujeitos ao controle imperialista, considerados "progressistas", ou de centro-esquerda". A Venezuela, a Argentina, o Equador e a Bolívia são os quatro mais processados pelas multinacionais no CIADI.

Há quase uma década, vários países latino-americanos e muitos do terceiro mundo vivem em função dos julgamentos de um tribunal internacional conhecido como Centro Internacional de Ajuste de Diferenças Relativas aos Investimentos (CIADI), dedicado a julgar ações milionárias de empresas multinacionais contra os Estados.

A Argentina, a Bolívia, o Equador, a Venezuela e o México acumulam faturas de cerca de 80 bilhões de dólares em processos por decisões governamentais que afetaram investimentos nas suas economias. Este montante sobe para quase 200 bilhões de dólares se ampliarmos o mapa de processos aos mais de 60 países da América Latina, Ásia e África que esperam uma sentença do CIADI.

Este organismo foi fundado em 1965 para proteger os investimentos externos diretos mediante Tratados de Proteção. "As ações só podem ser interpostas por empresas contra o Estado, não ao contrário. Não existe uma instância superior, por isso as decisões do CIADI não podem ser apeladas nem revistas", afirmou em 2007 o economista belga Alan Goods, fazendo referência à denúncia do CIADI feita por três Estados da Aliança Bolivariana das Américas, Alba. Segundo dados do site especializado em dívida externa com sede em Bruxelas, cadtm.org, das 252 sentenças emitidas até 2009, os Estados perderam 250.

Uma revisão dos documentos deste organismo evidencia que a montanha de dinheiro a ser cobrado é resultado da quantidade de Tratados de Proteção de Investimento assinados por cada país nas duas últimas décadas. 72% dos processos atuais figuram desde 1991, quando o neoliberalismo andava pelo mundo. Nos primeiros 35 anos de existência, foram assinados 602 Tratados de Proteção de Investimentos entre Estados e empresas, enquanto quase na metade desse período, 18 anos, triplicaram até chegar aos 1.857 Tratados (Sonia R. Jiménez, Unam, México 2009).

Até o ano passado, 147 países tinham aceitado suas normas, mas atualmente vários governos tentam se afastar do CIADI. Esta tendência foi inaugurada pela Bolívia e pelo Equador entre 2007 e 2009, quando os dois Estados renunciaram ao organismo para não pagar as ações milionárias a favor das empresas estrangeiras afetadas por decisões oficiais. O Equador foi sentenciado a pagar 12 bilhões de dólares e a Bolívia cerca de 4 bilhões. Desde então, outros quatro países do nosso continente, cinco do Oriente Médio e três da Europa Oriental tentam fugir deste tribunal.

Guiados pelas estatísticas do CIADI/Banco Mundial, de 1975 a 2011, o Tribunal Internacional de Diferenças, com sede em Washington, julgou e setenciou 228 processos contra 98 países. Em 81 casos perderam Estados da América Latina e do Caribe, seguido da África negra com 45 resoluções desfavoráveis, a Ásia com 34, os governos do mundo árabe com 28 sentenças desfavoráveis; o resto das ações tiveram que ser pagas por nove Estados europeus da Ex-Urss, pela Turquia e pelos pequenos países da Ásia.

A Argentina é o país com mais processos dentro dos tribunais do CIADI. Um total de 58 causas a partir de 2002, que custarão cerca de 20 bilhões de dólares, depois de ter negociado um desconto de quase 30 bilhões em 2009.

Na América Latina, depois da Argentina vem a Venezuela, com 22 processos e um custo aproximado de 42 bilhões de dólares, mais do que o total das suas atuais reservas. (Dr. Luis Britto García, Aporrea, Caracas 18/01/11). Os tratados de investimento são estabelecidos por cerca de 10 anos. A Argentina estaria mais pressionada, pois seus julgamentos começaram entre 2001 e 2003. Apesar de que na Venezuela quase todos apareceram entre 2007 e 2009, quando foram nacionalizadas e expropriadas mais de 60 propriedades, o valor supera o dobro da Argentina. Nos dois casos, a pressão sobre as reservas e finanças será a mesma.

A maioria das sentenças do CIADI recaem sobre países latino-americanos que pertencem à União de Nações do Sul (Unasul) e à Alba, que possuem políticas autônomas em relação aos principais organismos financeiros internacionais. Nesse contexto, se justificaria a expressão do intelectual venezuelano Luis Brito García, que classificou as ações do CIADI como um "golpe judicial".

Rebelión publicou este artigo com a permissão do autor, mediante uma licença do Creative Commons, respeitando a libertade para publicá-lo em outras fontes.

Fonte: http://multimedia.telesurtv.net/pt/opinion/venezuela-saiu-do-ciadi/

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