Ao Dous de Julho - Castro Alves
(Recitada no Teatro S। João)
É a hora das epopéias,
Das Ilíadas reais.
Ruge o vento—do passado
Pelos mares sepulcrais.
É a hora, em que a Eternidade
Dialoga a Imortalidade...
Fala o herói com Jeová!...
E Deus — nas celestes plagas —
Colhe da glória nas vagas
Os mortos de Pirajá.
Há destes dias augustos
Na tumba dos Briaréus.
Como que Deus baixa à terra
Sem mesmo descer dos céus.
É que essas lousas rasteiras
São — gigantes cordilheiras
Do Senhor aos olhos nus.
É que essas brancas ossadas
São—colunas arrojadas
Dos infinitos azuis.
Sim! Quando o tempo entre os dedos
Quebra um séc'lo, uma nação...
Encontra nomes tão grandes,
Que não lhe cabem na mão!...
Heróis! Como o cedro augusto
Campeia rijo e vetusto
Dos séc'los ao perpassar,
Vós sois os cedros da História,
A cuja sombra de glória
Vai‑se o Brasil abrigar.
E nós, que somos faíscas
Da luz desses arrebóis,
Nós, que somos borboletas
—Das crisálidas de avós,
Nós, que entre as bagas dos cantos,
Por entre as gotas dos prantos
Inda os sabemos chorar,
Podemos dizer: "Das campas
Sacudi as frias tampas!
Vinde a Pátria abençoar!..."
Erguei‑vos, santos fantasmas!
Vós não tendes que corar...
(Porque eu sei que o filho torpe
Faz o morto soluçar. . . )
Gemem as sombras dos Gracos,
Dos Catões, dos Espartacos
Vendo seus filhos tão vis...
Dize‑o tu, soberbo Mário!
Tu, que ensopas o sudário
Vendo Roma—meretriz!...
Ai! Que lágrimas candentes
Choram órbitas sem luz! —
Que idéia terá Leônidas
Vendo Esparta nos pauis?!...
Alta noite, quando pena
Sobre Árcole, sobre Iena,
Bonaparte—o rei dos reis—,
Que dor d'alma lhe rebenta.
Ao ver su'águia sangrenta
No sabre de Juarez!?...
Porém aqui não há grito,
Nem pranto, nem ai, nem dor...
O presente não desmente
Do seu ninho de condor...
Mãos, que, outrora de crianças
A rir— dentaram as lanças
Dos velhos de Pirajá....
De homens hoje, as empunhando,
Nas batalhas afiando,
Vão caminho de Humaitá!...
Basta!... Curvai‑vos, ó povo!...
Ei‑los os vultos sem par,
Só de joelhos podemos
Nest'hora augusta fitar
Riachuelo e Cabrito,
Que sobem para o infinito
Como jungidos leões,
Puxando os carros dourados
Dos meteoros largados
Sobre a noite das nações.
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