sábado, 17 de março de 2012
Neonazis europeus voltam-se para o terrorismo
Poucos dias após um ataque à bomba contra um
hotel da capital da República Checa, ao que parece de caráter racista,
especialistas e ativistas alertaram para as campanhas “terroristas” de
organizações neonazis, que recebem uma maior influência dos movimentos de
extrema direita de outros países. Por Pavol Stracansky, da IPS.
Organizações extremistas de países como Alemanha,
Itália e Rússia oferecem aos movimentos checos inspiração operacional,
organizacional e ideológica, e dão apoio em expressões de violência racial e
estratégias para reunir apoio político.
“É um facto constatado que os partidos checos e
alemães de extrema direita têm acordos de cooperação”, disse à IPS a conhecida
ativista Gwendolyn Albert. “Os checos agora parecem seguir a tática alemã de
contar com uma presença relativamente importante, ter partidos políticos registados
e organizar manifestações das quais participam os que estão comprometidos
ideologicamente com a violência racista, com a intenção de cometer algum ato
violento”, acrescentou a ativista. “O impacto dos vínculos ultranacionalistas e
fascistas russos também podem ser vistos quando os manifestantes de extrema
direita possuem uma organização paramilitar que enfrenta a polícia”, destacou
Albert, que trabalha para a organização de educação e direitos humanos Romea
Roma, vinculada ao povo cigano.
O alerta foi dado no começo deste mês, quando o
Ministério do Interior divulgou um informe sobre a extrema direita neste país,
que aponta ser provável o aumento de ataques racistas nos próximos anos, em
parte pela influência de organizações de extrema direita estrangeiras que usam
a violência e o terrorismo, especialmente as da Rússia. Os grupos neonazis
russos estiveram envolvidos em campanhas terroristas, como ataques e
assassinatos de juízes que teriam condenado fanáticos e ativistas de extrema
direita. Algumas testemunhas especialistas em julgamentos semelhantes na
República Checa disseram que enfrentaram ameaças e intimidações. De facto, no
começo deste mês foi necessário adiar o julgamento contra um suspeito de ter
cometido um ataque racista, por causa de uma ameaça de bomba.
Organizações neonazis alemãs também têm
antecedentes de terrorismo. Há pouco tempo, descobriu-se que uma célula alemã
chamada Socialista Nacionalista Clandestina foi responsável pelo assassinato de
nove imigrantes e um polícia nos últimos seis anos, bem como de roubos a bancos
e atentados à bomba. Além disto, ex-neonazis alemães disseram que há uma forte
cooperação entre grupos de extrema direita alemães e checos, e que os campos de
treino de tiro para neonazis de toda a Europa pertencem a organizações alemãs e
estão em território checo.
O autor do informe do Ministério do Interior,
Miroslav Mares, disse que os grupos de neonazis têm cada vez mais armas.
Conseguem armamento infiltrando-se na polícia e em serviços de segurança
privados, o que lhes permite obter licença para porte de armas e, em alguns
casos, receber treino em situações de combate. Um exemplo, de quanto esses
grupos foram longe em matéria de se armarem, foi quando a imprensa informou que
numa manifestação de grupos de extrema direita havia participantes com
explosivos exclusivos do exército. O temor de um aumento da violência racista
deu-se no contexto de problemas raciais ocorridos em áreas socialmente
desfavorecidas do país.
No ano passado, houve protestos maciços e episódios
violentos no distrito de Sluknov, norte da República Checa, após uma onda de
ataques e crimes que os habitantes locais atribuíram à população cigana. Alguns
analistas atribuíram o aumento da tensão às crescentes dificuldades económicas.
Observadores do racismo na Europa detetaram um aumento de sentimentos negativos
contra os imigrantes e as minorias desde o começo da crise financeira em 2008.
O informe do Ministério do Interior mencionou a degradação da situação
económica e o aumento da exclusão social como outros fatores do prognosticado
aumento dos ataques racistas.
No entanto, para o sociólogo Mares, o terreno
fértil para a violência contra as minorias foi criado por algumas figuras
políticas de destaque. “Vemos um aumento do racismo ‘comum’. Nas regiões
socialmente conflituais percebe-se a participação da população local em
manifestações contra os ciganos, e os neonazis são o motor das atividades e dos
preconceitos contra eles”, declarou à imprensa local. “Agora, ouve-se
declarações racistas de dirigentes que não são de partidos extremistas. Alguns
partidos tradicionais utilizam uma retórica contra os ciganos, que poderia ser
um contexto para mais atividades violentas dos neonazis”, alertou.
A extrema direita procura capitalizar o sentimento
antiminoria. Na última década, a maior parte deste setor na República Checa fez
um esforço para distanciar a sua imagem da dos skinhead e converter-se numa
alternativa política viável. O Partido Justiça Social dos Trabalhadores é a
expressão política da extrema direita e baseia-se especificamente em
preconceitos contra a população cigana. Para os especialistas, os extremistas
adotam táticas para conseguir seguidores mediante a promoção da sua rejeição –
não apenas dos ciganos, mas dos imigrantes em geral – bem como outros assuntos
controversos, como o casamento homossexual.
Organizações internacionais contra o racismo
indicam que a situação só melhorará se os dirigentes políticos derem o exemplo
e forem aprovadas leis para fortalecer as ferramentas legais para dissuadir o
racismo. Georgina Siklossy, assessor de imprensa da Rede Europeia Contra o
Racismo, com sede em Bruxelas, explicou à IPS que “os políticos têm a principal
e mais importante responsabilidade de não utilizar discursos de ódio, que
possam incitar ataques racistas e contribuir para um sentimento contra os
setores minoritários”, acrescentando que “as autoridades checas também podem
utilizar medidas concretas para combater os grupos de extrema direita, como,
por exemplo, assegurar leis que criminalizem o racismo”. Os programas de
prevenção em escolas são essenciais se o desejo é mudar a situação, observou
Mares.
Contudo, a comunidade cigana é pessimista. Houve
uma série de ataques incendiários nos últimos anos contra esta comunidade. Um
deles, em 2009, deixou uma menina de dois anos incapacitada para o resto da
vida. E, nos últimos seis meses, houve 23 atentados racistas contra os ciganos,
que deixaram três mortos. Emil Vorac, diretor de uma organização não governamental
cigana que trabalha na cidade de As, onde no começo deste mês houve um ataque à
bomba contra um hotel onde viviam membros dessa comunidade, afirmou que este
tipo de ação era previsível. “Não me surpreendeu porque parece que o racismo e
a xenofobia aumentam aqui e a situação piora. Esta é a minha experiência de
trabalhar em vários comités e comissões nesta região. Os seus membros atuam
como xenófobos em muitos casos”, ressaltou.
ARTIGO | 15 MARÇO, 2012
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