sexta-feira, 23 de dezembro de 2011
EUA está já na América latina
A INVASÃO SILENCIOSA DOS EUA NA AMÉRICA LATINA
Para falar sobre os planos da ultradireita
latino-americana, que é um instrumento de Washington na região, e analisar a
atual conjuntura política do continente, o Observatório Sociopolítico
Latinoamericano - http://www.cronicon.net/ dialogou, em Buenos Aires , com
Stella Calloni.
Acompanhados por um bom café no Centro Cultural da
Cooperação Floreal Gorini, em plena Avenida Corrientes , a investigadora nos
fez uma consciente análise da realidade latino-americana e da ingerência
estadunidense.
Calloni é uma jornalista experiente; escritora e
poetisa. Foi correspondente de guerra na América Central e se especializou em
política internacional. Em sua vasta obra publicada estão incluídas crônicas,
ensaios e livros, entre outros, como Torrijos y el Canal de Panamá (1975); La
guerra encubierta contra Contadora (1993); Nicaragua: el tercer día (1986);
Panamá, pequeña Hiroshima (1992); Los años del lobo: Operación Cóndor (1999);
Operación Cóndor, pacto criminal (2001); Argentina: de la crisis a la
resistencia (2002); la invasión a Irak, guerra imperial y resistencia (2002);
América Latina siglo XXI (2004); Evo en la mira. CIA y DEA en Bolivia (2009).
Atualmente,
é correspondente do Cone Sul para o diário La Jornada , do México e também atua
como docente universitária. Entre as múltiplas distinções que recebeu,
destacam-se o Premio Latinoamericano José Martí (1986); Premio Madres de Plaza
de Mayo (1998); Premio Margarita Ponce Derechos Humanos de la Unión de Mujeres
Argentinas y Premio Latinoamericano de Periodismo Samuel Chavkin, da revista
Nacla Report of the Americas de Nueva York, ambos em 2001; além do Premio
Escuela de Comunicaciones de la Universidad de la Plata , Argentina (2002).
Em função jornalística, percorreu praticamente toda
a América Latina, bem como vários países da Europa, da África. Portanto, suas
análises são feitas a partir de apalpar a realidade no próprio terreno. É
conferencista internacional sobre temas de geopolítica latino-americana e sobre
direitos humanos.
A INVASÃO SILENCIOSA DOS EUA NA AMÉRICA LATINA
- A senhora
considera que a ingerência dos Estados Unidos tem se configurado de maneira
mais sutil, ou continua sendo mantida a mesma estratégia de finais de século XX
para dominar os povos?
- Se eles, em todos os seus documentos de política
exterior, começaram a considerar que deviam levar em conta a Doutrina Monroe
("América para os americanos") equivale assinalar que ela continua
sendo a base de muitas coisas que eles fazem, com algo muito mais grave: agora
o lema é "o mundo para os americanos". Tudo isso, mais a
reconfiguração que aconteceu após as Torres Gêmeas, que é um fato que ainda não
sabemos quem é o responsável; pois, poderão dizer o que queiram, mas provas não
existem de nenhuma espécie; é como se você me dissesse que alguém possa me dar uma
prova de que a pessoa que mataram no Paquistão era Bin Laden. Não há provas;
não existem e o que Estados Unidos digam, para mim não tem nenhuma veracidade,
porque mentem eternamente. Após a configuração dessa doutrina de segurança
hemisférica, começa também a nova doutrina de guerra preventiva, de guerra sem
fronteiras e sem limites; desconhecendo as soberanias nacionais, ao mesmo tempo
em que executam outra vertente de trabalho, que é sutil: o envio de todas essas
fundações que nasceram durante o esplendor conservador de Reagan para evitar a
presença direta da CIA, sobretudo depois de 1975, quando se formou a Comissão
Church no Senado estadunidense para investigar o papel dessa Agência de
Inteligência no golpe de Estado no Chile, o que motivou que, nos anos 80, a
renovação da estratégia de conflitos e de guerra de baixa intensidade, que tem
como base a contrainsurgência, que, em linguagem norte-americana, é a permissão
aberta para todo tipo de ilegalidade no plano militar, político, cultural,
social, econômico etc. Quando já se recicla para o período dos anos 90, são
conformadas a NED (National Endowment for Democracy, fundação para a
democracia; porém, teríamos que perguntar-nos que tipo de democracia), a Usaid
(a agência internacional para o desenvolvimento, que nunca teve esse papel).
Mas, sabemos que onde se instala esse organismo, há uma interferência direta
dos Estados Unidos e a CIA está por trás. Com isso, conseguiram a invasão
silenciosa na América Latina. Pude verificar isso diretamente no próprio terreno,
por exemplo, na Bolívia, e observei como essas fundações trabalham, criando
ONGs, que cumprem um papel chave na guerra de baixa intensidade; isto é,
desestabilização de governos; intromissão em lugares; trabalho com grupos
indígenas, como é o caso boliviano, no qual buscaram um líder indígena para
fazê-lo aparecer, com o propósito de substituir a Evo Morales. Infelizmente, os
governos latino-americanos ainda são muito débeis e não têm a suficiente
clareza no sentido de que devem deter esse intervencionismo que pode levar a
situações muito complicadas. De fato, no golpe de Estado na Venezuela, estavam
a NED, a Usaid e outras fundações, inclusive socialdemocratas da Europa, que
ficaram metidas no esquema internacional da CIA.
A
ULTRADIREITA MILITAR LATINO-AMERICANA
- E no golpe
de Estado em Honduras contra o presidente Manuel Zelaya?
- Em
Honduras, também; e aí a intervenção teve também a participação de Unoamérica,
sobre a qual a Colômbia deve ter muito cuidado e estar bem atenta às suas
atuações. É uma fundação que nasceu na Colômbia, com um grupo de militares da
ultradireita e com vários ex-militares de todas as ditaduras da América Latina.
- Qual é seu propósito?
- O propósito é praticamente executar a Operação
Condor levada a outro plano. Apesar de que a Operação Condor não pode ser
repetida. Unoamérica coincide no trabalho supranacional para poder mover-se sem
nenhum limite nos vários países. Esses militares de ultradireita sustentam o
mesmo que na época do Plano Condor, no sentido de que assim como o Cone Sul
tinha que combater a coordenadora guerrilheira que havia se integrado nos anos
70, agora tem que enfrentar tanto os governos de esquerda, que participam no
Fórum São Paulo, quanto a Unasul, a qual consideram igualmente uma organização
supranacional; portanto, eles devem atuar para evitar o comunismo, porque falam
do comunismo como se fosse no tempo da Guerra Fria. Por isso, nuclearam ao pior
que encontram de militares envolvidas nas ditaduras latino-americanas e
realizam um trabalho especial dentro dos grupos de segurança dos exércitos e
das polícias, reciclando o discurso anticomunista do passado. Fazem um trabalho
nas Forças Militares da região porque têm suas velhas conexões e, por isso,
jogaram um papel determinante no golpe de Estado em Honduras. Alejandro Peña
Esclusa, que hoje está preso na Venezuela e que é o presidente de Unoamérica,
foi condecorado por Roberto Micheletti por sua colaboração efetiva para dar o
golpe. Unoamérica provê mercenários, faz contrainsurgência para as necessidades
da CIA, se move por toda a América Latina; vários de seus integrantes estiveram
na Bolívia metidos no golpe de Estado que tentaram contra Evo Morales e,
sobretudo, na tentativa de assassiná-lo.
- Conhecendo
o ex-presidente colombiano, o tão questionado Álvaro Uribe Vélez, que papel ele
joga em Unoamérica, de acordo com suas investigações?
- Vários militares que fazem parte de Unoamérica,
segundo os registros que tenho, apóiam aos grupos paramilitares na Colômbia e
são muito próximos a Uribe. Na Argentina, temos já a lista dos vinculados a
essa fundação, que é encabeçada pelo coronel do grupo de caras-pintadas, Jorge
Mones Ruiz, bem como há militares da ultradireita boliviana, uruguaia; eles
buscaram os remanescentes das velhas ditaduras latino-americanas e se apóiam
politicamente em grupos ultradireitistas da região.
- Geopoliticamente falando, nas atuais
circunstâncias, quais são os aliados mais importantes dos Estados Unidos na
América Latina?
- Geopoliticamente, enquanto está a invasão
silenciosa, por cima estão mandando tropas e o porta-aviões dos Estados Unidos
na região obviamente é a Colômbia com todas as suas bases militares e com sua
estrutura. Além disso, o golpe de Honduras conservou a base de Palmerola e as
novas como a Base de Gracia de Dios, que lhes permite controlar a Nicarágua.
- Aqui na Argentina, existe o convencimento de
que na Colômbia estão operando as sete bases que o governo de Uribe entregou ao
Comando Sul dos Estados Unidos. No entanto, a Corte Constitucional proibiu a
utilização dessas bases. Segundo suas investigações, ditas bases militares estão
realmente operando?
- Na realidade estão aí. É algo muito similar ao
que acontece com a Base Mariscal Estigarribia, do Paraguai, ou com a Base de
Palmerola, em Honduras. Aí , o que existem são pistas onde podem aterrizar
aviões grandes, como têm feito na Colômbia. Essas bases não estão ocupadas
permanentemente por soldados norte-americanos porque eles nunca se metem em
lugares fechados. Agora, os Estados Unidos não necessitam enviar soldados para
fazer funcionar as bases militares; mas as têm à sua inteira disposição.
Obviamente, têm tudo preparado para se acaso necessitam mandar tropas. Ou, como
acontecia na Bolívia, em que metiam uma estrutura da DEA dentro de uma base,
que utilizaram quando quiseram matar Evo Morales, na época em que era deputado.
Algo parecido estão fazendo na Colômbia.
JUAN MANUEL
SANTOS E SUA RELAÇÃO COM O MOSSAD
- Na
Colômbia também operam o Mossad (Agência de Segurança Israelita) e o Mi6
(Serviço de Inteligência Inglês). Em outros países latino-americanos também
operam?
- O Mossad
está no Paraguai, na Bolívia, na Venezuela e na Guatemala. Na Venezuela, sua
presença é muito forte e na Colômbia opera há muitos anos, inclusive, antes que
chegasse seu agente Yair Klein, que treinava e trazia da Jamaica armas para os
grupos paramilitares. O problema é que o Mossad, atualmente, tem mais força do
que a CIA; vários de seus membros se infiltram em comunidades judias dos países
latino-americanos; porém, além disso, estão presentes no Iraque e na Líbia. Nas
tarefas e na direção de todas as movidas de guerra suja, o Mossad é chave. No
caso colombiano, o presidente Santos é filho do Mossad e ele não pode
separar-se de Israel. Não se pode esquecer o papel que Santos jogou no ataque a
Sucumbíos, quando a soberania equatoriana foi violada, para atacar o
acampamento de Raúl Reyes. Recordo o sorriso de hiena de Santos quando mataram
esse chefe guerrilheiro. Não creio que Santos queira a paz na Colômbia, como
Israel tampouco a quer; o que ele deseja terminantemente é exterminar de
qualquer maneira a um grupo político-militar insurgente.
- E no
México, cuja situação social é muito explosiva?
- Nessa ocupação geopolítica, do Plano Colômbia,
que é um plano de recolonização do continente, passaram para o Plano Mérida, do
México. Esse plano é uma cópia do Plano Colômbia e, de fato, em seis anos, o
México caiu em uma violência atroz. Nesse lapso, temos o mesmo número de mortos
que na Colômbia e a isso devemos somar a destruição do campo mexicano e da
cultura profunda dos povos, com o Tratado de Livre Comércio que assinou com os
Estados Unidos e com o Canadá.
DESINFORMAÇÃO,
ARMA DE GUERRA
- Falemos de
outro aspecto fundamental para condicionar os povos, que é a guerra
midiática...
- A guerra midiática é parte do projeto
contrainsurgente. Hoje, a desinformação é uma arma de guerra utlizada para
armar um projeto de guerra como aconteceu no Iraque, com a invenção das armas
de destruição massiva, ou com o que aconteceu na Líbia, onde nunca houve um
bombardeio de Gadafi contra a população civil, o que está totalmente provado.
Para controlar o mundo, necessitam controlar a informação.
- A senhora denunciou o aproveitamento das
máfias durante a etapa de esplendor do neoliberalismo...
- Um dos aspectos que temos que identificar nesse
período histórico é a presença mafiosa nos governos. Os Estados Unidos estão
sob o poder de máfias; sempre as usou para seus jogos. Necessitam da máfia; não
podem sobreviver a esse esquema sem ela. Quem recebe a droga nos Estados
Unidos: Onde é recebida? Mas, vem matar no lado mexicano; porém, por que não se
dedicam a pescar do outro lado aos que recebem a droga? Por que os aviões
carregados de droga chegavam às bases do Comando Sul, na Florida? E não era
Manuel Antonio Noriega quem a mandava, porque ele não tinha nenhuma capacidade
de operar com o Comando Sul. Mentiram de uma forma descarada na invasão do
Panamá (em 20/12/1989) e percebi tudo porque eu estava lá. A gênese de todas as
intervenções tem uma mentira por detrás e um aparelho de desinformação, que
agora é mais fácil porque controlam tudo.
A LIDERANÇA DE CHÁVEZ
- Apesar de
uma matriz de manipulação midiática, boa parte das pessoas na América Latina já
não acreditam, e isso pode ser observado em países como a Venezuela, o Equador,
a Bolívia, a Argentina, o Uruguai... Que pensa?
- O que acontece é que não entenderam que o
processo neoliberal iria trazer uma realidade social terrível e as pessoas
começaram a ter um olhar distinto. Isso aconteceu em países como a Venezuela,
com Chávez, cujo povo passou a ser pensante e consciente.
- Falando da
Venezuela, a senhora esteve recentemente em Caracas. Como está a liderança de
Chávez? Tem possibilidade de reeleger-se em outubro de 2012?
- Sim, tem possibilidade de reeleger-se; inclusive,
os índices de popularidade e de apoio ao seu governo aumentaram. Vejo que há
uma grande consciência nas pessoas com relação aos alcances positivos do
processo político liderado por Chávez. As coisas e os grandes avanços que foram
feitos na Venezuela não são divulgados; porém, há uma recuperação do sentido de
pátria, de defesa, de dignidade; e a enfermidade de Chávez produziu um
apressamento nas bases para solidificar a unidade e a organização.
- Processos integracionistas que estão
acontecendo na América Latina, como Unasul e Celac constituem uma pedra no
sapato de Washington?
- Sim; qualquer coisa que seja unidade e integração
é uma pedra no sapato. A unidade africana e a intenção que tinha Gadafi de
concretizar uma moeda comum na África incomodam aos Estados Unidos. São coisas
que eles não podem aceitar. Agora, tem uma América Latina com uns países modelo
de algo distinto. No começo, não davam importância porque sempre os Estados
Unidos conseguia interferir; por exemplo, em processos como o Mercosul. Porém,
agora, a coisa é diferente, e nisso Chávez teve uma presença histórica, porque
foi a cabeça para produzir uma federação distinta. Essa nova integração
política e comercial dos países da América Latina é algo terrível para os
Estados Unidos e, sobretudo, os fatos protagonizados por presidentes como
Chávez e Evo Morales. No caso da Bolívia, Morales retirou a CIA e a DEA. Desde
que a DEA saiu da Bolívia, e isso para os colombianos é essencial, o país
deixou de ter uma violência no índice que tinha; deixou de morrer gente por
conta da suposta guerra contra o narcotráfico. A embaixada norte-americana
contava com um escritório na casa de governo, junto a do presidente da Bolívia.
Quando Evo Morales assumiu perguntou por uma porta fechada junto ao seu
escritório, que conduzia aos escritórios da DEA e da CIA. Para que saibamos até
onde chegou a ingerência norte-americana sem que os países da América Latina o
soubessem.
O BLOQUEIO A
CUBA, DELITO DE LESA HUMANIDADE
- Falemos de
Cuba. Hoje, a revolução cubana não é nenhuma ameaça aos Estados Unidos. No
entanto, em pleno século XXI, como se explica que Washington continue mantendo
o bloqueio econômico à ilha? Não é o caso de delito de lesa humanidade?
- Claro! É um delito de lesa humanidade. Além
disso, tudo o que o bloqueio produziu, as consequências das agressões (como a
guerra química e biológica contra Cuba), a cifra de doentes, o número de mortes
pela dengue hemorrágica, mais a invasão a Bahia Cochinos, está reconhecido pelo
próprio Congresso dos Estados Unidos. Mas Cuba continua sendo um exemplo de
como poder resistir a noventa milhas do império para manter uma revolução que
não quer sair do socialismo. Em contraste, os Estados Unidos ficaram em mãos de
uma máfia que eles mesmos criaram. Uma máfia cubana que conta com senadores,
representantes, governadores, prefeitos, todos com um passado espantoso e com
relações profundas com o narcotráfico. Tentaram destruir Cuba por todos os
meios, o bloqueio foi feito, inclusive, mais forte; porém, não puderam
asfixiá-la e não creio que consigam.
AMÉRICA
LATINA E SEU MELHOR MOMENTO HISTÓRICO
- Com
exceção de países como o México, a Colômbia, o Chile e algumas nações da
América Central, a América Latina está passando por um bom momento histórico,
que pensa?
- Historicamente, a América Latina está passando
por seu melhor momento; tem conseguido salvar-se da crise econômica e mostrar
ao mundo que o remédio que estão utilizando na Europa não serviu para nada; portanto,
podemos dizer que estamos à vanguarda da resistência, com lideranças como as de
Chávez, Kirchner, Evo, Correa que brotaram dentro de um jogo eleitoral que os
Estados Unidos impunham como salvação. Quantas tropas necessitarão para poder
controlar o mundo? O certo é que os Estados Unidos vão a caminho de afundar. E
em relação com a América Latina temos que dizer que nossos governos não podem
mostrar nem um pouquinho de debilidade, porque qualquer abertura dá pé para que
se meta esse poder imperial; temos tudo para evitar e uma mostra disso é o que
aconteceu com a OEA, que já não tem voz; está falando como um afônico, porque a
Unasul a substituiu mesmo sem ser ainda um organismo totalmente sólido.
Fontes:
Espanhol:
Português traduzido por ADITAL
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