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domingo, 22 de janeiro de 2012

O islã político e o problema palestino

Por: Alberto Piris

Depois das discretas e eficazes manobras diplomáticas da Autoridade Nacional Palestina (ANP) no ano outono passado, que a levaram a ser aceita como membro com plenos direitos da UNESCO frente à oposição dos Estados Unidos e como um passo a mais na sua aspiração de se converter em Estado soberano, na última terça-feira começou em Amã uma rodada de negociações palestino-israelenses, depois de mais de um ano sem contato entre ambas as partes.

Convém esclarecer que a palavra "ambas" não é correto neste caso, já que confluem diretamente os interesses de três partes. Nas reuniões iniciais desta rodada participam Al Fatah (que governa a ANP) e o governo israelense, sob a vigilância do rei Abdulá II da Jordânia, apoiado pelos Estados Unidos e pela União Europeia. Enquanto isso, o terceiro elemento em discórdia, o primeiro-ministro de Gaza (governada pelo Hamas), preferiu viajar à Turquia e expressar seu interesse e solidariedade com o movimento político transnacional que ficou conhecido como "a primavera árabe".

Este é o fator mais difícil de analizar atualmente, porque poderia modificar e ressucitar um problema em ponto morto, para o qual não se vê uma saída a curto prazo. Se estas negociações tentam satisfazer a opinião internacional, fazendo com que os governos das potências ocidentais e regionais acreditem que as partes se esforçam para chegar a um acordo, é evidente que muito pouco mudou. Enquanto os palestinos exigem o fim da expansão dos assentamentos israelenses em territórios ocupados e o reconhecimento das fronteiras de 1967 como base para iniciar qualquer negociação, Israel se empenha em negociar "sem condições prévias" e se aproveita do prolongado estancamento para usurpar o território palestino, até que qualquer ideia de soberania estatal seja irrealizável.

Neste ponto é onde pode incidir a revolução árabe que se extendeu da Tunísia até a Síria, e cuja evolução apresenta numerosas incertezas. Alguns analistas, tanto árabes como judeus, coincidem na ideia de que os contatos agora retomados obedecem ao fato de que as partes implicadas se sentem afetadas pelo crescimento do islamismo em seu aspecto mais preocupante: o auge do islã político. Este fenômeno poderia alterar consideravelmente o esquema das forças atuantes na região, e obrigar os palestinos, israelenses e jordanianos a adotar novas posturas em relação aos seus vizinhos.

O aparente equilíbrio no qual está baseada a política israelense de dar margem ao assunto e esperar que o contínuo assédio contra o povo palestino e a fragmentação territorial façam cacos das esperanças palestinas de se tornar um estado viável, foi revertido em 2011. Por outro lado, depois da queda de Mubarak, que foi o apoio do governo palestino, a ANP busca se aproximar da Jordânia e trata de encontrar no rei Abdulá, o amigo leal que substitua o deposto ditador. Isto só pode lhe acarretar desprestígio frente às massas árabes levantadas contra os tiranos que gozavam do apoio material e moral dos Estados Unidos e do Ocidente. Não parece uma boa carta de apresentação no complexo panorama político do Oriente Médio.

Como vai atuar o "islã político" nos distintos Estados onde triunfa? Esta é a parte principal da incógnita. Para alguns políticos árabes, o Hamas vai evoluir, do mesmo modo que a Irmandade Muçulmana, rumo a posturas de realismo prático, que lhes torne fácil o acesso ao poder, contribuam com a aprovação dos países ocidentais e o apoio das massas populares. Não e fácil atender de uma só vez a estes três aspectos, desde o momento em que na própria Palestina o mero fato de participar destas negociações é considerado por grande parte da população como uma concessão ao esmagador poder israelense e seus efeitos mais evidentes: a expansão dos assentamentos e as contínuas dificuldades que a ocupação acarreta para a vida cotidiana dos palestinos.

Durante as antes mencionadas gestões da ANP nas Nações Unidas, o presidente palestino definiu como data limite o último dia de janeiro para retomar sua ofensiva diplomática rumo à criação formal do Estado Palestino, se antes não se chega a um acordo satisfatório. As probabilidades de consegui-lo hoje parecem mínimas. O governo israelense tem pouca margem de manobra, já que nele dominam os que não aceitam a ideia de um Estado palestino e favorecem à ampliação dos assentamentos para torná-lo impossível. Seu ministro da Defesa anunciou ao Parlamento o perigo que suporia um Sinai convertido em um ninho de terroristas e que, caso o presidente sírio seja derrocado, o mesmo ocorreria nos altos do Golã, mostrando uma tendência terrorista que colocaria em perigo a segurança de Israel, e gerando assim uma sensação de urgência que torna muito difícil qualquer acordo pacífico pela via diplomática.

Graves são os problemas que se cruzam nessa crítica região compreendida entre o Mediterrâneo e o Mar Arábico, berço secular de enfrentamentos, e não convém descuidá-los por mais que outras questões urgentes e mais imediatas atraiam a nossa atenção por esses dias.

Fonte:
http://multimedia.telesurtv.net/pt/opinion/o-isla-politico-e-o-problema-palestino/

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